(ao deixar o STF, Barroso vota a favor do aborto na ADPF 442)
Imitando o que fez a ministra relatora Rosa Weber em 2023, o ministro Luís Roberto Barroso, no dia anterior à sua saída da Suprema Corte, pediu ao novo presidente Edson Fachin uma sessão virtual extraordinária para deixar seu voto favorável ao aborto até 12 semanas, no julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 442. Tanto ela em 2023 quanto ele em 2025 não quiseram expor-se ao plenário físico.
Na noite de sexta-feira, 17/10/2025, às 20 horas, Barroso declarou que acompanhava o voto da Relatora favorável ao aborto: “Minha posição na matéria é conhecida e já a manifestei ao julgar o Habeas Corpus nº 124.306”. Com isso ele confessou que a ADPF 442 nada mais é do que uma tentativa feita pelo PSOL (Partido Socialismo e Liberdade) de estender para todos (erga omnes) os efeitos de seu voto-vista em 29/11/2016, que concedeu ordem de habeas corpus a uma quadrilha que praticava abortos em Duque de Caxias (RJ). Naquela época, Barroso defendeu que os acusados deveriam ser postos em liberdade não apenas por razões processuais, mas pela dúvida sobre a própria existência do crime de aborto. Segundo ele, os artigos 124 e 126 do Código Penal (que incriminam o aborto) deveriam ser interpretados “conforme a Constituição” para excluir o aborto praticado nos três primeiros meses de gestação.
No seu voto no plenário virtual, Barroso demonstrou sua habilidade retórica desviando a questão moral do aborto para o destino a ser dado à mulher que pratica o aborto.
Vale dizer: se o Estado deve ter o poder de mandar a Polícia, o Ministério Público ou o juiz obrigar uma mulher a ter o filho que ela não quer ou não pode ter, por motivos que só ela deve decidir. E, se ela não concordar, mandá-la para o sistema prisional.
No texto acima, “ter o filho” deveria ser substituído por “não matar o filho”. O Estado tem o poder de obrigar a mulher a não matar o filho? Sim. O dever de não matar se estende a todos os filhos, tanto os nascidos como os nascituros.
Deve a mulher ter o direito de decidir matar ou não matar o próprio filho? Não. O respeito à vida do filho não depende de uma escolha subjetiva da mãe.
Se a mulher matar o filho, deve ser enviada ao sistema prisional? Sim, seja o filho já nascido ou por nascer. Isso vale também para o homem que mata o filho, incluindo o que constrange a mulher a fazer um aborto.
No Brasil, porém, nenhuma mulher é presa por praticar aborto. Como o aborto praticado em si mesma ou com seu consentimento (art. 124, CP) é um crime cuja pena mínima é de 1 (um) ano de detenção, aplica-se o artigo 89 da Lei 9099/95. O Ministério Público, ao oferecer a denúncia, propõe a suspensão do processo por dois a quatro anos, submetendo a mulher acusada a um período de prova, sob a condição de não poder frequentar determinados lugares, não se ausentar da comarca sem a autorização do juiz e comparecer mensalmente a juízo para informar e justificar suas atividades. Logo, hoje nenhuma mãe é presa por abortar seu filho.
Outro estratagema de Barroso foi desviar o foco da criança e concentrá-lo na “mulher”, em oposição ao homem: “Ninguém duvide: se os homens engravidassem, aborto já não seria tratado como crime há muito tempo”. Faltou lembrar que cerca de metade das crianças abortadas são meninas, tão mulheres como suas mães.
Terminado o voto de Barroso, Gilmar Mendes, o próximo ministro a votar, pediu que o julgamento fosse destacado para o plenário físico. O novo relator, ministro Flávio Dino, determinou que o feito fosse retirado de pauta. Ficou assim finalizado o julgamento virtual na própria sexta-feira, às 21h52. Até agora, dois votos em favor da morte.
Por causa de Geovana
Em 11 de outubro de 2005, eu era estudante de Direito da UFG e deparei-me com a notícia de que uma criança – que depois seria chamada Geovana – estava para ser abortada pelo único motivo de ser deficiente. Era portadora da síndrome de “body stalk” (cordão umbilical curto). A sentença de morte havia sido dada pelo juiz da 1ª vara criminal de Goiânia. Sabendo que tal aborto era crime – e que não deixaria de ser crime por causa da “autorização” de um juiz – resolvi impetrar, com base na lei e na Constituição, um habeas corpus em favor do bebê. Os funcionários da escrivania, porém, não permitiram que eu fotocopiasse os autos do processo. Não tive escolha a não ser redigir a petição a mão em folha avulsa, no próprio balcão da escrivania, e protocolá-la junto ao Tribunal com pedido de liminar para sustar a sentença que autorizara o abortamento. Fiz isso por dever de consciência, mas temia que o aborto já houvesse sido realizado ou que a liminar chegasse tarde, como tantas outras vezes já ocorrera.
Em 15 de outubro de 2005, um sábado, uma notícia do jornal O Popular (Goiânia) confirmou minha suspeita:
O desembargador Aluísio Ataídes de Sousa, em decisão de gabinete, suspendeu ontem alvará judicial que autorizou o aborto de feto com síndrome de Body Stalk, em gestante de 19 anos. A decisão, entretanto, perdeu objeto, pois o procedimento já foi realizado[1].

Diante da notícia do aborto já consumado, dei o caso por encerrado. Vários dias depois, porém, eu saberia que tal notícia era falsa. A liminar havia chegado a tempo de salvar Geovana da morte. Ela estava para ser abortada no dia 14 de outubro de 2005, quando chegou ao Hospital Materno Infantil (Goiânia) a decisão liminar do Desembargador Aluízo Ataíde de Souza sustando o aborto e cassando a sentença que o autorizara.
Esse equívoco jornalístico foi lamentável. Se eu soubesse que Geovana estava viva no ventre materno e que seus pais haviam voltado com ela para Morrinhos (GO), sem dúvida teria ido visitá-los, acompanhá-los durante a gestação, exortá-los a amarem sua filha até o último momento, oferecer-lhes assistência durante o parto (como fez nossa instituição com tantas outras gestantes) e, em se tratando de uma criança com risco de morte iminente, batizá-la logo após o nascimento. E se ela falecesse, para mim seria uma honra fazer suas cerimônias fúnebres e acompanhar a família até o cemitério.
O habeas corpus serve apenas como medida de emergência para salvar o bebê de um ato de desespero dos pais, mas não substitui o cuidado pastoral junto à família.
Quando eu soube de tudo, Geovana Gomes Lomeu já havia nascido por parto normal no Hospital Municipal de Morrinhos em 22 de outubro de 2005, às 12 horas, e morrido às 13h40min, sem que ninguém se lembrasse de batizá-la. De qualquer forma, ela recebeu um nome e foi sepultada no Cemitério São Miguel, destino bem melhor que o de ser jogada fora e misturada ao lixo hospitalar.
Um detalhe. Ao impetrar o habeas corpus em favor do nascituro, tive o cuidado de identificar-me não como sacerdote, mas como “estudante de Direito”. Não usei argumentos religiosos, mas jurídicos. E o desembargador relator acolheu meu pedido simplesmente porque verificou que o juiz que autorizara o aborto agira com ilegalidade e abuso de poder em relação à vida de um inocente. No entanto, os promotores do aborto, ao descobrirem que o impetrante tinha sido um “padre”, desviaram a questão jurídica para a acusação antirreligiosa. Teria tal padre “imposto” seus conceitos e valores a terceiros, “obrigando” uma gestante a carregar o peso “inútil” de um “feto” (não se diz bebê) “inviável” (não se diz deficiente). Uma organização feminista aproveitou o ensejo para produzir um filme narrando, de maneira panfletária e caricatural, o ocorrido durante a gestação, o nascimento e a morte de Geovana. Não contente com isso, em 2008, a advogada dos pais de Geovana teve a brilhante ideia de convencê-los a ajuizar uma ação de reparação de danos morais contra mim, por tê-los impedido de abortar sua filha! Na verdade, não tinha sido eu quem impedira o aborto, mas o Poder Judiciário, na pessoa do Desembargador Aluízo Ataíde de Souza, que concedera a liminar. Por que então a advogada não acionou o desembargador? Primeiro, porque ele não era apto a ser acusado de “fundamentalismo religioso”. Segundo, porque seria nula a possibilidade de ele ser condenado por seus colegas do Judiciário. Resolveu então a advogada fazer do impetrante o “bode expiatório”. Seria o padre o culpado por ter pedido (e não o Judiciário por ter ordenado) que Geovana não fosse abortada.
Com uma tese tão estranha, essa ação indenizatória foi rejeitada tanto pelo Fórum de Goiânia quanto pelo Tribunal de Justiça de Goiás. Foi então que a advogada interpôs um Recurso Especial ao Superior Tribunal de Justiça. Surpreendentemente, a relatora, Ministra Nancy Andrighi, reverteu a decisão do Tribunal de Justiça de Goiás, condenando-me, em 20 de outubro de 2016, a pagar R$ 60.000,00 aos pais de Geovana pelos danos morais que sofreram por não terem podido abortá-la. Toda a 3ª Turma do STJ acompanhou o voto da relatora.
Na hora de executar a sentença, surgiu um problema: não encontraram em mim nenhum bem penhorável. Livros e roupas não podem ser penhorados (Cf. art. 833, III e V, CPC/2015). Tiveram então uma ideia: alegaram falsamente que eu dispunha dos bens do Pró-Vida de Anápolis como se fossem meus. Haveria assim, uma confusão patrimonial entre os bens do presidente (que na época era eu) e os bens da instituição por mim presidida. Suscitaram o incidente de desconsideração inversa da personalidade jurídica, ou seja, solicitaram que os bens do Pró-Vida de Anápolis fossem usados para quitar minha dívida judicial.
Em 23/03/2023, o juiz da execução indeferiu o pedido, alegando não haver provas da confusão patrimonial. No entanto, os advogados dos pais de Geovana recorreram com um agravo de instrumento ao Tribunal de Justiça de Goiás. Em 20/11/2023, a relatora desembargadora Beatriz Figueiredo Franco, mesmo na ausência de provas, acolheu o recurso (assim como toda a 4ª Câmara Cível) para possibilitar que a execução recaísse também sobre o patrimônio da instituição.
Por duas vezes, as contas bancárias do Pró-Vida de Anápolis sofreram penhora “on line”, ou seja, tiveram seus valores bloqueados. Quanto mais o tempo passava, mais cresciam os juros moratórios e a correção monetária. O valor penhorado estava muito aquém de saldar a dívida, que em 2025 já ultrapassava R$ 600.000,00.
Foi então que, em 30/09/2025, graças à intercessão de São José, nosso patrono, a quem recorremos continuamente, a parte contrária aceitou firmar um acordo: o valor da dívida foi reduzido para R$ 140.000,00 dividido em 28 parcelas mensais de R$ 5.000,00.
Em 03/10/2025, o juiz homologou o acordo entre as partes e julgou extinto o processo.
Precisamos de benfeitores
A quitação da dívida vai durar mais de dois anos. Até lá, precisamos de pessoas dispostas a ajudar-nos para que tenhamos, a cada mês, cinco mil reais para depositarmos na conta da mãe de Geovana.
As doações podem ser feitas para
PRÓ-VIDA DE ANÁPOLIS
CNPJ 01.813.315/0001-10
em uma das seguintes contas bancárias:
Ag. 0014 Op. 013 Conta Poupança 99594-9 CEF
Chave PIX: escritorio@providaanapolis.org.br
Ou
Ag. 0324-7 CC 7070-X BB
Chave PIX: 01 813 315 0001 10
Envie uma mensagem por e-mail para escritorio@providaanapolis.org.br avisando sua doação, para nosso controle contábil.
Deus lhe pague.
Anápolis, 3 de novembro de 2025.
Pe. Luiz Carlos Lodi da Cruz
Vice-presidente do Pró-Vida de Anápolis.
[1] Waldineia LADISLAU. Aborto negado e decisão nula. Goiânia, O Popular, 15 out. 2005, p. 8. O destaque é nosso