(toda a Igreja espera a palavra do Papa sobre a família)
A controvérsia sobre a circuncisão
Paulo e Barnabé estavam em Antioquia da Síria quando chegaram alguns vindos da Judeia (conhecidos como judaizantes) e disseram aos cristãos não judeus: “se não vos circuncidardes segundo a norma de Moisés, não podereis salvar-vos” (At 15,1). Houve então uma grande controvérsia, e todos resolveram dirigir-se a Jerusalém onde, na época, estava Simão Pedro. Diante da discussão acesa da assembleia, Pedro levantou-se e fez um discurso argumentando que não é pela circuncisão, mas “pela graça do Senhor Jesus que nós [judeus] cremos ser salvos, da mesma forma como também eles [os gentios]” (At 15,11). A Escritura prossegue dizendo: “Então, toda a assembleia silenciou” (At 15,12). A palavra de Pedro, a quem Jesus deu o poder e a missão de confirmar seus irmãos na fé (cf. Lc 22,32) pôs fim a uma discussão que parecia interminável.
A controvérsia sobre a anticoncepção
O Concílio Vaticano II (1963-1965) estava trabalhando na elaboração da Constituição Gaudium et spes (sobre a Igreja no mundo de hoje), quando surgiu entre os Bispos uma discussão acesa sobre a licitude do uso de meios anticoncepcionais (em particular, a pílula recém-inventada) para regular a procriação. O Papa Beato Paulo VI resolveu então chamar a si a questão, tirando-a do debate conciliar. Segundo nota de rodapé colocada na própria Gaudium et spes, “algumas questões, que necessitam de investigações mais aprofundadas, foram por ordem do Sumo Pontífice confiadas à Comissão para o estudo da população, família e natalidade, para que, terminados os estudos, o próprio Papa decida”No entanto, os quatro anos de silêncio do Beato Paulo VI causaram um enorme dano ao mundo cristão. Enquanto Pedro silenciava, falsos profetas alardeavam que a doutrina da Igreja já havia mudado ou estava para mudar, e já davam, “antecipadamente”, permissão para os casais fazerem uso da pílula anticoncepcional. Quando finalmente Pedro falou por meio da Humanae vitae, a mentalidade contraceptiva já se havia espalhado entre os cristãos. Houve uma rebelião por parte de teólogos, bispos e até de episcopados inteiros contra o ensinamento perene do Magistério. E até hoje sentimos os efeitos do prolongado silêncio de Pedro sobre esse tema da moral conjugal.
A controvérsia sobre os divorciados “recasados”
Em 2013, o Papa Francisco resolveu convocar duas assembleias do Sínodo dos Bispos: uma extraordinária entre 5 e 19 de outubro de 2014 e outra ordinária entre 4 e 25 de outubro de 2015. O objetivo era discutir Os desafios pastorais da família no contexto da evangelização. Na verdade, trata-se de um Sínodo sobre a família dividido em duas fases com a distância de um ano.
A Assembleia de 2014 foi marcada por uma grande tensão. O relator geral do Sínodo, Cardeal Péter Erdö, no dia 13/10/2014, leu um relatório intermediário (Relatio post disceptationem) que continha várias ideias estranhas à doutrina da Igreja, incluindo o acesso dos divorciados em segunda união (“recasados”) ao Sacramento da Comunhão. Essa tese havia sido apresentada pelo Cardeal Walter Kasper no consistório de cardeais realizado em fevereiro de 2014. No entanto, em setembro de 2014, cinco cardeaisE o que disse o Papa Francisco sobre tudo isso? Em seu discurso de conclusão do sínodo, em 18/10/2014, o Santo Padre advertiu sobre a tentação de quem, “em nome de uma misericórdia enganadora, liga as feridas sem antes as curar e medicar” e a tentação de “descuidar o ‘depositum fidei’ [depósito da fé], considerando-se não guardiões mas proprietários e senhores”No entanto, não é preciso um grande estudo para que o Santo Padre resolva a questão. Basta reafirmar o ensinamento de São João Paulo II na sua Exortação Apostólica Familiaris consortio, também esta fruto de um sínodo sobre a família celebrado em 1980. Após falar da misericórdia com que devem ser tratados os divorciados que contraem nova união, a Exortação diz:
A Igreja, contudo, reafirma a sua práxis, fundada na Sagrada Escritura, de não admitir à comunhão eucarística os divorciados que contraíram nova união. Não podem ser admitidos, do momento em que o seu estado e condições de vida contradizem objetivamente aquela união de amor entre Cristo e a Igreja, significada e atuada na Eucaristia. Há, além disso, um outro peculiar motivo pastoral: se se admitissem estas pessoas à Eucaristia, os fieis seriam induzidos em erros e confusão acerca da doutrina da Igreja sobre a indissolubilidade do matrimônioDe fato, convidar tais divorciados “recasados” à Comunhão eucarística seria, nas palavras de São Paulo, torná-los “réus do Corpo e do Sangue do Senhor” (1Cor 11,27), seria fazê-los “comer e beber a própria condenação” (1Cor 11,29). Eles que, segundo as fortes palavras de Cristo, “cometem adultério” (Mc 10,11-12), de nenhum modo serão beneficiados por receberem indignamente o sacramento do altar.
O Sínodo ordinário de outubro de 2015 aproxima-se e, com ele, novas discussões. No entanto, o que a Igreja espera, com grande expectativa, é a Exortação pós-sinodal que será feita pelo Papa, recolhendo diversas propostas feitas pelos Cardeais em ambas as assembleias. É possível que, em tal Exortação, Pedro venha a presentear-nos com um belíssimo tratado sobre o matrimônio cristão, contendo uma refutação explícita dos ensinamentos de Kasper. Mas é possível que, até lá, por causa da demora, um enorme dano já tenha sido causado na mente dos fieis.
Anápolis, 10 de julho de 2015.
Pe. Luiz Carlos Lodi da Cruz
Presidente do Pró-Vida de Anápolis